maio 30, 2010

QUADRÂNGULO – 30.05.10

Abre o olho e, num presente desses efêmeros que a natureza oferta a todos indistintamente e que alguns mais atentos captam, Alice recebe no quadrângulo da janela do banheiro, o reflexo estelar de Vênus que aos poucos vai saindo do seu pequeno ângulo de visão na janela.
Dissipado que se fez, pensa Alice na transição rápida das coisas da vida, cuja atenção tem sido o fator emergencial para ser merecedora de benesses assim como esta de ver brilhar um planeta em forma de estrela por um rápido período da noite e em dias específicos do ano.
Pensa quantos outros presentes ela pode captar com a atenção focada aos olhos de ver. Uma vez visto, sempre visto, porque haverá ela de atentar quanto aos próximos dias de aparição do planeta.
Mas, levando para sua vida diária, percebe com medo sobre a invasão que insiste em permear as boas intenções das grandes potencias ao continuar falhando e maculando rios e mares com poluentes que não param de vazar. Seria um puxão de orelhas devendo ser encarado como um atentado contra as más intenções?
Ora, se o planeta e a água que é de todos precisam de proteção, o que, aliás, precisaram desde os primórdios não sendo cuidados devidamente, resta-nos considerar a nós próprios como inaptos para a proteção de um bem tão imenso que por ser dado em presente, não está sendo valorizado. Por que este comportamento de descuido não desencadeia do Estado, com seu poder coercitivo e punitivo, uma solução ou um caminho que demande a atenção necessária para um fato tão irreversível para todo o mundo?
Os valores já foram alterados há muito; e o pouco do respeito pela natureza que tem restado não se mostra suficiente, mesmo já sendo evidente uma razão plausível para a futura guerra do mundo em busca da água. Esta situação já se faz presente e pouco tem sido feito sobre tal fato. Espera-se a atenção emergencial que deve talvez ocorrer quando o racionamento de água efetivamente atingir todas as torneiras ainda aptas a recebê-las.
Se a falta de cuidado se restringisse à água tão somente, estaríamos salvos, mas o descuido é geral e irreversível. Ainda se insiste que o capitalismo vem em primeiro lugar, vindo só bem depois o meio ambiente. É como se estivéssemos construindo um edifício sem nos preocuparmos com sua base de sustentação. É um erro tão primário, ainda assim absurdamente praticado, tendo como “justificativa” o capitalismo sobre o qual fomos advertidos por Marx quanto aos efeitos colaterais sem, no entanto, importamos com este fato.
Assim, Alice sente o incômodo ante a perspectiva da efemeridade também sobre o mundo. Talvez não esteja o homem atual num estágio que contribua para a evolução, mas, muito mais para a destruição.
Se for assim, àqueles que se encaixam em uma versão proveitosa da evolução, brigando e interrogando quanto ao lixo gerado sobre o planeta, restará somente a esperança de que todo o resto do planeta desperte para o que já deveriam estar despertos, atentos e em combate: a favor da vida acima de qualquer outro bem material que se possa vindicar. É simples e básica noção de prioridade. Por que não é seguida?
Como não encontrasse a resposta e Vênus, o mais brilhante dos planetas acabara de ocultar-se para os olhos de Alice, ainda assim ela pode ter a certeza de que ele continua brilhando imperceptivelmente, como deveria acontecer com o azul neste lado oposto tão povoado e mal cuidado.

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maio 23, 2010

GAFA NHOTO COMEU – 23.05.10

Não sabe ao certo se é ritual ou se são reposições conjeturais de outras grandezas. Sabe apenas que olhar para a tela branca é por vezes o seu modo de entremear o domingo. Enquanto olha, toca o telefone. É Pedro fazendo como fazem os machos, delimitando território. Onde aprendem a fazer isto?
Eles dois são assim meio complementares que não se tocam. Do lado de cá podem ser vistos os seus gestos, cuja recíproca parece ser verdadeira também do lado de lá. Entre gestos e marcação de território, ela se pergunta qual é a verdade desta vez. Parece ter se desencatado dele. Aliás, parece ter se desencantado dos homens.
Mas ele, pedra que é, se fez forte, e tenta estudar francês não ficando claro para ela com que objetivo. Mas ele estuda para a prova de amanhã, ouve Karla Bruni e num passe de maestria, diz para ela ao telefone que baixou as músicas, letras e traduções da cantora que ele quer comum entre eles dois.
Ela, que continua sem entender a implicação das coisas, vez que passara o encantamento das longas conversas, finalmente rende-se a conclusão inevitável, tal qual o silogismo mais hipotético, senão patético, que já pudera armar.
Enquanto pensa come doce. Reve o coqueiro e suas folhas, de vez em quando uma ou outra pedindo para ser retirada da árvore. E ela atende. Pensa em deixá-la secando ao sol, depois transforma-la talvez, num cesto para pão-de-queijo, quem sabe.
Quando vê um gafanhoto comendo suas folhas, briga com ele, tenta espantá-lo, mas ele também é pedra. E volta insistentemente para o coqueiro. Ela continua sua análise em torno da planta, tentando especificar quando será sua primeira frutescência. Lamenta uma vez mais por não cursar agronomia.
Reconhecendo seu trabalho com letras, tenta compor um Hai kai. São versos muito pequenos que ainda assim contam a história, ou o resumo do resumo da história. “Coqueiro sem coco, folha sem verde, gafanhoto farto no toco”.
Enquanto isto, liberta seu pensamento sobre o que há de precisar Pedro, depois de afastar-se da amiga, quase mãe. Ela pensa com a cabeça dele, que por certo iria interpor um valor para sua necessidade de boa conversa, boa dica de música, de vinho, de mulheres e de buscas na vida.
É que o garoto se perde e é ela quem o encontra. Encontrados ou desencontrados, seguem ambos enviando e recebendo mensagens sobre filmes, sobre “la Langue francese” e outras utilidades deles dois, que não encontram nos demais, que não justificam porque assim, mas que seguem em frente como tais.
Entretanto, parece ter feito ela um seguro de vida daqueles que dão segurança de fato na vida. Ela se garante bem sozinha, sabe das implicações de ser só porque já esteve junto. Ele, que não sabe ainda da importância de ser dois, para quem sabe voltar a ser um depois, fica por assim dizer, buscando entender a necessidade que tem de ser dois.
Munida desta informação, ela descobre que melhor que tentar montar um hai kai é demonstrar a teoria da auto-libertação para quem ainda está longe dela. É divertido, dá adrelina porque nos despe de tolos medos e nos faz brincar com situações que já não exercem qualquer fascínio naqueles que são felizes sozinhos, prontos para se doarem sem medo de que venham a sofrer uma nova perda.

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maio 16, 2010

ELE COM ELA E A BICICLETA – 16.05.10

Eles dois parecem um só. Ela se parece Priscilla com dois “eles” como gostam de complicar as mães cujos nomes são tão comuns quanto “Maria”. Ele chamemo-lo Pedro ante tanta determinação, pois, parece ter aguçada a curiosidade acerca das mulheres manifesta desde que se entendeu por gente. São tão pequenos e já entabulam sozinhos algumas decisões pelos caminhos, parecendo cúmplices quando não se preocupam em chegar à escola a tempo e hora.
Vão serpenteando por entre as ruas com muita conversa e parada para comer biscoito, menos chegar à escola estadual exposta no uniforme de Priscilla. Pedro parece não estudar naquele horário. Já é um homem de seus 13 ou 14 anos e demonstra uma virilidade precoce, incomum aos meninos da sua idade, que odeiam meninas, e brincam de bola e não se importam com tanta coisa. Não ele! Quem sabe não esconde uma idade um pouco maior!
Priscilla, com seu porte pequeno aparenta seus12 anos no máximo, e começou a segui-lo conversando enquanto caminhava ao lado da bicicleta de Pedro, que se mostra gentil, educado, atencioso e todos os predicados que as mulheres detectam em um homem quando querem se aproximar destes.
Talvez seus nomes se combinem com a mesma letra inicial; talvez não. Mas, que eles dois combinam em ideias, isto transparece nitidamente; difícil será encontrar outro casal mais precoce com tamanha afinidade. É tamanha, que outro dia um casal que também caminhava bem cedo parou para observá-los comentando sobre o desvio do caminho da menina que deveria estar àquela hora na escola.
E eles seguem conversando como se o mundo ao redor não importasse, e o horário da aula de Priscilla fosse um pequeno detalhe que não interferisse na amizade consolidada deles dois.
A evolução deste relacionamento produz efeito maior sobre o menino, que agora já leva sua amada na bicicleta, ambos parecendo um só em disposição de conversar. A conversa deles dois parece ser a melhor do dia ou bem mais agradável do que qualquer aprendizado. E o lanche deles, quem sabe nem tomam o café da manhã com seus pais, começa ou estende-se em cima da bicicleta de Pedro.
Pode ser que eles consolidem uma amizade que os acompanhará por toda a vida; pode ser que já seja amor. Também pode ser carência de conversa em casa. Ou pode ainda faltar-lhes tanta atenção, que ambos resolveram “atencionalizar-se” um com outro, de comum acordo, tendo como testemunha cada amanhecer onde eles devem sair de casa cedo com um sorriso escancarado nos lábios não porque vão para escola...
E existem pais que não descobrem isto a tempo e nem mesmo tarde. Enquanto alguém não os delata, a conversa segue sua evolução natural de crianças que ainda são, com a intenção pura de se fazerem amigos, mesmo à custa do que deveriam estar aprendendo na escola.
Perdem em aprendizado acadêmico, podem ganhar na amizade a determinar-lhes uma personalidade muito melhor, porquanto boas conversas aliviam a alma; e fazem-se incomum aos olhos de curiosos que seguem paralelos pela rua, tentando redescobrir a inocência que já perderam ou a confiança que não dão mais a ninguém; e não por acaso, em questão de dias serão eles dois pegos ou pela professora dela, ou por algum conhecido que descobrirá a menina na rua em horário da escola.
Para todo o resto que segue em caminhos normais rumo à saúde, restará uma expectativa de verem Priscilla na escola e Pedro passeando sozinho logo cedo em sua bicicleta de adulto, com sua aparência também de adulto e propósito idem na mesma data, quando terá aprendido que a escola também faz bem; ainda que não produza a adrenalina que sua bicicleta associada à boa companhia pode propiciar.

maio 10, 2010

UM PÉ LÁ E OUTRO CÁ – 10.05.10

Levanta sempre cedo. Olha-se ao espelho como buscasse algum defeito físico. Apaziguada que se fez com sua aparência, resta-lhe buscar falhas no seu interior. Ali se encontram alojadas um sem número de falhas.
Desfila por todas, perpassando uma a uma, questionando qual teria maior poder sobre ela, quase soberana, não fosse pelo medo que sente algumas vezes de ir, outras de ficar.
É assim que se sente por agora, quando tenta uma posição para justificar incógnitas que lhe ocorrem eventualmente não conseguindo explicar, chegando a temer contar a alguém que talvez pudesse ajudá-la a entender o que de fato lhe ocorre certas vezes.
Então, transformada que se vê em buscadora, nunca abandonando a ideia de conhecer-se melhor, esbarra na oportunidade de tal conhecimento e nesta hora tem medo. Na sua ignorância provavelmente não tivesse, mas, advertida passou a temer pelo que descobrirá sobre si.
Por outro lado, invade-lhe a possibilidade de aquietação íntima, de conformidade por ser preocupada com todos os demais que só se preocupam consigo, com seu bem-estar. Questiona-se porque não é assim, tendo a mesma origem e mesma criação.
Quer entender o algo além das aparências, indisponível a quantos disto não busquem, mas não a ela, que disto necessita mais do que arroz com feijão. Sendo assim, não lhe resta outra opção que não seguir na sua busca.
Sabe que está procurando problemas para a cabeça. Queria simplesmente recuar e continuar simplesmente em busca dos seus interesses que lhe consomem o dia e parte da noite.
Provavelmente, assim estaria mergulhando num mar de confusão ainda maior. Suas questões não podem ser respondidas na sua origem, na sua escola, nos livros que lê, nas regras que postula ou recebe postuladas. Tampouco pode viver ao sabor das buscas daqui da terra, como fazem os normais.
Admite-se anormal e busca entender sua anormalidade imperativa, que não dá tréguas impondo a não limitação para o pensamento. Este segue sempre na velocidade da luz, o que desencadeia toda a busca e toda a sorte de confusão mental.
Então, quando de repente encontra o caminho que pode lhe responder as questões, para e olha com medo, com dúvida, sem saber se segue. Por ser um caminho diferente, que exige entrega, causa medo. E ela coloca um pé lá e outro cá, permanecendo assim até ter certeza de poder retirar o pé de cá e saltar para lá. Ou o inverso.
Mas, o inverso causa-lhe desconforto porque ela tem mania de pensar antes nos outros, que podem não gostar dessa indefinição culminando com mais uma negação do antecedente que imperativamente determina seguir em frente, recusando ao status quo.
Novamente não encontra opções. Os caminhos que busca, em via de regra não admitem opções; daí a necessidade de um pé lá, outro cá. Consola-se com Cecília ao ter que escolher “Ou isto ou aquilo”.
Finalmente deduz que seu maior aprendizado consiste na exatidão da escolha, sem perspectiva de retroceder por dúvidas. É bom admitir de pronto que a dúvida cerceia a vontade mais íntima, estabelece intimidações que nos torna escravos da indecisão.

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maio 02, 2010

ASSUMINDO A DIFICULDADE – 01.05.10

Longe de ser “expert” em autoajuda ou ajuda ao próximo, até porque quando movimenta parece mais um trem bala desgovernado porque não tem notícia de outro meio terrestre mais rápido de ir e vir.
Olha para as pessoas tranqüilas com suas idas sempre iguais, na mesma velocidade diária tentando imaginar o que elas comeram no café da manhã, talvez uma proteína sendo mais bem sintetizada no organismo ainda não ingerida por ela, que passa veloz, e não consegue diminuir sua marcha quase “hitleriana”.
Se fora o hoje o dia de assumir dificuldade, então, que o faça com a determinação necessária ao sucesso. Assumir que é boa em alguma coisa é indício de problema para ela; assim, assumir dificuldade não é seu maior sofrimento.
Sabe que precisa urgentemente valer-se de uma técnica que lhe dê tranqüilidade para responder questões fechadas, de múltipla escolha, já que este mister não combina com velocidade que acaba gerando confusão.
Sua característica mais genial ela assume sem modéstia, a de observar a personalidade das pessoas e suas implicações. Por isto, quando a sua personalidade vem à baila, ela própria cuida da crucificação sem direito a choro, velas e flores.
Enquanto pensa degusta uvas secas, observando o brilho que até então elas não tinham. Eram secas com força de sê-lo. Agora, deduz pela técnica da observação que estas estão brilhantes e têm um óleo que espera não ser saturado. Deve ser o das uvas mesmo. Mas, detectou um ingrediente a mais, como se acha capaz de deduzir em toda comida que degusta.
Seguindo em frente apaziguada com seu editor que segue detectando até mesmo seus pensamentos errados, sublinhando-os todos de vermelho, ela toma seu intento de analisar seu fracasso em provas. Sabe toda a matéria e se confunde ao marcar.
Admite ser pusilânime o suficiente para buscar enésimas justificativas assim como fariam Einstein, Freud, Sócrates e tantos mais que costumam questionar a veracidade das questões. Admite gostar muito mais da verossimilhança do que da verdade. Aquela é mais generosa que esta, sempre altiva, suprema, sem admitir recursos. São estas as questões que precisa confrontar.
Como então teria gostado tanto de matemática ao ponto de cursar esta disciplina, acreditando inclusive, na aplicação das fórmulas às questões pessoais e às grandes questões mundiais? Talvez, pela ramificação da matemática aplicada. Já inventaram a matemática quântica? Então, aproveita esse momento para solene para definir-se uma “matemática quântica”.
Para desmistificar a tendência de que não poderia escrever, tem praticado por ora, muito mais a arregimentação com letras do que as fórmulas matemáticas, tendo caracterizado recentemente o ápice de Einstein como sendo a sua descoberta na física: E=mc², já que energia é massa com velocidade. E velocidade não lhe falta, energia também não, fato, portanto, inconteste por ela. Ponto pacificado e pronto.
Mas, sua questão merece solução. Esta não vem a cavalo porque não jogaria tal solução para São Jorge resolver. Do que lhe resta como alternativa, assumir que não basta determinação e dedicação aos estudos para sair-se bem. Necessita algo mais. Chama a isto equilíbrio. Reconhece que não é boa nesta questão porque teria que gostar de química, coisa difícil no momento.
Propõe a solução que pode salvar-lhe o currículo ou quem sabe, um novo concurso: equilíbrio na hora da prova; isto implica ausência de ansiedade, tranqüilidade para os neurônios trabalharem sem pressão. Fácil a solução. Para começar, informa a enciclopédia virtual que o equilíbrio químico se aplica às reações reversíveis. Ora, alvíssaras por ela não ter sido queimada (restando-se irreversível, irrecuperável) encontrando-se em estado que ainda não descartou como reversível. Ainda lhe resta, portanto, a esperança que dizem não se extinguir jamais (sendo sempre reversível).

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