dezembro 26, 2010

UM NOVO OLHAR SOBRE O MUNDO – 25.12.10

Ontem obtive um resultado prático sobre como a massa encefálica que ocupa a porção superior e anterior da caixa craniana manifesta sua vida própria. Acredite seriamente no resultado se disser que irá levá-la para dar um passeio. Os efeitos da endorfina agem de imediato.
Assim, saindo para mais uma caminhada onde afirmo levar não apenas o corpo, mas também o cérebro para passear, é realmente assim que funciona. Esta massa que ora ensina meu olho a ver sob a perspectiva multi-focal e ao retornar àquela anterior mono-focal, provoca sintomas inacreditáveis e constantes de distúrbios visuais nunca antes experimentados.
Descobri então, que foi passada como informação cerebral uma nova forma de enxergar a vida. Até aí tudo bem; concluímos o que já era sabido: que é o cérebro quem nos manda. Em mandando sabe fazê-lo com maestria, pelo que obedecemos com a sabedoria de quem se rende ante aquele que pode mais.
Obedecida que estou, tento agora uma conexão de ideias entre mim e o teclado que parece ter vida, com movimentos ondulatórios que você não acreditaria. Não fosse pelo fato de eu ser tão céptica, acreditaria mesmo que ele adquiriu vida – mais vida do que já tem adquirido.
E esta nova forma de enxergar a vida, pergunto-me até que ponto ela altera uma nova existência. Por agora tento entender os dois grupos claros e distintos de pessoas existentes no mundo, entre tantos outros, obviamente, mas que se distinguem dos demais por serem opostos: os otimistas e os pessimistas.
Meus olhos que jamais fogem à realidade, espero que nesta nova ótica possam mudar de posição; sempre foram pessimistas diante de tantos outros olhos, uma vez que enxerga as pessoas sem nenhum artifício, simplesmente como são, considerando seus defeitos e qualidades.
Se acaso a visibilidade distorcida denotar uma postura recalcitrante, inconveniente, da qual não me safo jamais, então é sinal de que as coisas não mudaram tanto. Porém, se ao contrário, eu estiver crente na bondade e sinceridade e desinteresse das pessoas sobre as coisas, aí terá havido mudança sensível e que mereça acolhida.
Por conseguinte, estarei cultivando de forma paulatina a crença em um mundo menos material. Fácil falar em menos materialidade quando não estamos do lado onde as coisas faltam. Fácil também de entender porque pessoas que se tornam ricas gastam milhares em sapatos ou em cabelos. Muito provavelmente aquilo lhe teria faltado em certa fase da vida em que seria essencial para sua afirmação como ser humano respeitado. Se mencionarmos que esse bem adquirido ou buscado passa a ser uma pessoa, aí, sendo sua posse impossível por questões óbvias, então as coisas ficam mais difíceis.
Pensando mais profundamente, até a maneira de pensar fica mais doída quando se altera o foco visual. Focos diversos nos levam a uma busca incansada da melhor visão, o que cansa, chateia e nunca clareia totalmente quanto se deseja, ao menos de início.
Enfim, com um ano prestes a ser novo, com expectativas de melhora quase por obrigação porque cada dia que passa existe menor espaço para pessoas duvidosas e inseguras, assim, espero que a “multifocalidade” valha-se realmente para o fim a que se presta porque de início é um aglomerado de dificuldade para ampliar, tal qual numa reforma onde se aumenta a casa, antes desalojando tudo.
Se ao menos os neurônios resistirem a tanta ondulação, enquanto a medicina não evolui de forma a atuar na frente do nosso cérebro, vamos tentando a adaptação gradual como um exercício de paciência que adverte sobre quem efetivamente manda na nossa evolução.

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dezembro 18, 2010

ENSAIO Nº 1 PARA ESCRITORES – 18.12.10

Eram inquietações de há muito e muito sem respostas. Tenho tentado descobrir a que se deve o mal-estar diante da obra em construção, depois dela acabada e continuando com ela comercializada. É um tormento que não cessa e que não se explica. É injustificado.
Tentei compreender um pouco além sobre escrever pensando ser questão de estilo, ou da falta dele que, segundo J. Middleton Murry é preciso cuidado para que a técnica não adquira vida própria e que o pensamento seja um servo da emoção. A mim parece por vezes questão de sobrevivência descobrir quem está mandando num dado momento, se o pensamento ou se a emoção é que se faz sistematizada para atender exigências do pensamento ao ser exteriorizada.
Assim, de acordo com a proposição de que a literatura consiste em comunicar emoções, admite-se de pronto que o escritor deve ter um vasto depósito de percepções sensoriais, o que nos leva a admitir por óbvio, que o trabalho do escritor consiste em transpor articulações do mundo material para o mundo espiritual.
A partir deste ponto, abandonei Murray para ter-me com Blanchot buscando a proposição inicial, qual seja, descobrir o que me leva a sentir a insatisfação constante, que não se aquieta nem mesmo quando se curvam os neurônios ante o trabalho duro de pensar.
Não por falta de estilo, já que até mesmo sem estilo podemos escrever. Ser bom e “estiloso” não é para todo e qualquer escritor indistintamente. Acredito que escritores são escolhidos para escrever, uma vez que não lhes sobra opção. Senti um salvamento por Blanchot no “L’espace littéraire” por entender a solidão essencial à obra e por vezes, prejudicial ao autor.
Indo mais além, sua obra nos leva à compreensão de que escrever é interminável, incessante, e carece de uma autoridade não demonstrada de onde vem e por quem vem. Para mim é mais ainda; é um jogo de espelhos. Existe uma entrega daquele que escreve impregnado de solidão, privando-se de si mesmo para promulgar quem sabe, alguma boa nova que nem mesmo o escritor consegue ciência com antecedência.
Portanto, escrever é ato que exige primeiro a intimidade com o silêncio, depois, um abandono de si mesmo para ao final, conseguir o esboço do que poderá ser material nobre de base para um texto coerente, com sentido, com arte. Eis quando o escritor descobre que não é nada senão um instrumento do qual se vale a ideia em estado bruto.
No diário tenta o escritor remeter-se as suas próprias vivências, que acabam misturadas ao medo que a solidão impõe ao trabalho perfeito. Vem daí o preço pago pelo escritor que nem sempre pode saldar. Restando o débito vem o mal-estar que não entendemos de onde e porque.
Entretanto, de posse dessas agruras típicas do escritor, existem outros sintomas que podem causar prazer. Sobretudo se o escritor entender o seu universo de trabalho, suas ferramentas atípicas, insólitas, de difícil manuseio, ainda mais por não contarmos com cursinhos, manuais de instrução que nos advirtam dos perigos psicóticos com cognomes e heterônimos.
Ocorre que nenhum escritor se faz escritor; ele se vê escritor de repente. E deste gosto provado, difícil será o abandono, donde podemos inferir que existe o lado de “glamour”, por sinal igualmente perigoso como os sintomas de mal-estar.
São eles, satisfação pessoal que transcende aquela obtida pelo trabalho profissional comum, aquele para o qual nos treinamos e nos tornamos aptos como qualquer ser humano com boa vontade está apto para galgar. Na literatura não! Sentimo-nos escolhidos para pensar, elaborar, raciocinar, inventar uma teoria ou qualquer outra coisa para justificar uma ideia. É portanto, trabalho com perícia e técnica também, porém sem conhecimento prévio nem posterior sobre quem nos manda e nos orienta neste trabalho. Eis o mistério como fator incentivador.
Blanchot vai mais além quando envolve a questão do tempo que se faz ausente durante a confecção de uma obra, já que todo o escrito é inatural evolvendo a fascinação, que ao meu ver seria um termo menos próprio devido às opostas significações que podemos atribuir a este substantivo feminino.
E segue afirmando que escrever é entrar na afirmação da solidão onde o fascínio ameaça, onde corremos o risco da ausência de tempo, onde reina o eterno recomeço. Existe também uma transição entre Eu e Ele, de modo que o que me acontece não acontece a ninguém; ocorre assim, uma disseminação infinita de ações.
Neste ponto parece haver mesmo uma fascinação no sentido de atração irresistível porquanto transitar entre personalidades distintas, guardando obviamente o devido cuidado de não se confundir com as personagens não é produto que obtemos nas prateleiras de um loja de conveniências, embora esta fosse uma conveniência para apaziguar muitos conflitos, por suposto.
Da necessidade de escrever temos que enquanto escreve, o autor expõe-se perigosamente à pressão que exige que ele escreva, mas da qual também se protege. Ao meu ver, esta proteção se manifesta quando o escritor obtém sua liberdade da forma como na vida real não conseguiria.
Em Kafka podemos perceber a confusão que os negócios e família causavam em sua obra, e que no seu ponto de vista nunca chegaram perto do nível de aceitação do próprio autor. Chame a isto o conflito e o subterfúgio do qual pode se valer um escritor insatisfeito com sua criação, ainda que o seu redor aprecie a obra.
Por outro lado, Kafka buscou se salvar pela literatura, já que não gostava do seu trabalho. Pensava colocar para fora dele todo o seu estado ansioso através da literatura. Daí os seus textos tão intensos. Daí o susto por tantas semelhanças de sintomas, inclusive e com mais ênfase, aos inúmeros projetos onde só vê fracassos: estudar piano, violino, línguas, jardinagem, estudos hebraicos, estudos germânicos, literatura, tentativas de casamento. Ao final, depois de escrever escrever escrever, conclui: “Eu nada mais sou senão literatura, e não posso nem quero ser outra coisa”.
Ao meu ver toda a confusão de Kafka se residiu no fato de não saber viver sozinho e não poder viver com outras pessoas. Não teria preservado sua identidade literária intacta ante aos apelos econômicos da sociedade capitalista para a qual fora moldado. Vale ressaltar sua genialidade ao escrever seu diário, tão seriamente comprometido com a verdade sobre si mesmo, passando a impressão de que se crucificará diante do leitor nas próximas linhas. E o faria se lhe fosse possível.
Assim são os escritores. Por esses meandros suspeitosamente trafegam. Inadvertidamente transitam sem habilitação nem certificado de especialização. Não confirmam nem negam suas preferências, antes questionam a própria existência. Sou vivo ainda?

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dezembro 04, 2010

OS PODERES DE ALICE – 02.12.10

Parece inusitado, mas ela surge até quando não é chamada. Aliás, Alice nunca é chamada, e quando bem quer, lá está ela parecendo a dona da fala, da experiência narrada e das expectativas por dias melhores.


É assim, quando de repente, Alice ganha a fala que não é dela, o papel que não lhe cabe, mas que por outra, não caberia a mais ninguém. Assim, de súbito ei-la rondando o texto, virando personagem com todas as intenções, inclusive nos desfechos para os casos. Às vezes penso que ela me ronda. Isto poderia parecer um caso típico de esquizofrenia, mas, não chega a tanto. É apenas um espaço dentro do qual Alice cabe; feito a Barbie que, seja em que país for, mantém sua caixa própria, perfeitamente adaptada, inconteste quanto ao padrão de igualdade mundo afora.


Isto quer dizer que as crianças do Haiti, da Indonésia, do Vietnã e da Conchichina amam a mesma Barbie, magérrima e de pernas compridas, ao estilo manequim. E Alice, que por vezes se traveste de Barbie, parece ter caído da caixa, não se encaixando em nenhum outro lugar, fazendo parada no meu editor de texto.


Então, vem de súbito penetrar na minha história, levando-me a uma confusão sobre quem sou, se falo por mim mesma ou se estou num dado momento mixada com Alice. O fato é que no editor ela tem voz sobre mim. Tanto é assim, que por vezes intercepta um texto como dissesse que manda tanto quanto eu; quem sabe até mais.


Busco então uma equação, mais uma daquelas intransponíveis, onde os dados são ocultos, com a esperança que jamais me abandona, levando-me a rir de mim mesma, culpar-me absurdamente quando não tenho toda a culpa, debochar da minha desgraça, valer-me da minha insensatez que por muitas vezes coloca um saldo negativo sobre minha pessoa, ou quando nem tanto, ao menos dá um aspecto de credibilidade apenas parcial aos meus trabalhos que mereciam um crédito a mais.


Buscando tais créditos, ouço o farfalhar dos pássaros que me acordam na manhã muito cedo, como dissessem que a alguém devo os momentos de inspiração quando pinto, ou escrevo, ou medito, ou passeio, ou até mesmo por estar à toa na vida, se bem que a mim se encaixa mais “a toda na vida”, dada à agitação e à pressa de viver tudo de uma só vez.


Alice parece vir para fazer-me elaborar as coisas, aprender a diferença entre comer e degustar, entre desconfiar e amar, entre entregar e cobrar. Entretanto, minha equação repleta de incógnitas levam-me a um resultado contundente de que certos achaques ou chame de traços de personalidade são-nos inerentes como a própria pele. Não há como arrancar, eliminar, extirpar, neutralizar, ignorar; nada disto viria complementar a incógnita, nem mesmo a nevasca que ora invade a França e Frankfurt. Mas, a quem isto pode interessar? A mim, cujas preocupações atuais ultrapassam os limites territoriais da minha existência, graças a Deus.


Assim, por não ter tido a surpresa da interferência de Alice, talvez porque percebera que eu devesse estar prevenida para tal investida, perdesse a graça esta façanha estranha; uma invasão mais bárbara que as bárbaras. Ocorre, pois, que a vigília diuturna cansa, exaure, além de ser inimiga capital da inspiração, aflorada nos momentos de maior entrega do espírito e do perispírito também.


Também já deduzi que faz parte do show a alternância de vozes entre mim e Alice. Ela parece ser grande e eu pequena. Parece ser forte e eu fraca. Parece ser bonita e eu feia. Parece ser inteligente e eu acéfala. Ainda bem que somente parece. Ainda não obtive essa certeza. Obtendo-a pode ser que venha juntamente com a certeza da minha inferioridade consolidada hoje diante do meu raio de visão reduzido na tela do computador, revivendo em mim o ódio pelo oculista que nunca aumenta meu grau da maneira total e abrangente como tenho cada vez mais necessitado. Isto será assunto para uma próxima consulta.


Enquanto não aumento o grau da minha lente, aumento o exercício de “mea culpa” ao pedir desculpa, desculpa, desculpa pelos erros não visualizados. Vê, como até mesmo uma situação mal resolvida funciona de forma a atuar extirpando da gente o orgulho pelo trabalho bem feito! “Bem feito! Isto sirva para modelar seu ego firmemente e não essa gelatina que acredita em tudo quanto reluz.” Mas isto tudo eu sei. No entanto, nem sempre vigio.


Culpa das atividades pelas quais me lanço, que me fazem transitar por mundos opostos, valores diversos, pessoas incongruentes. Nem a soma dos ângulos internos do triângulo isósceles eu consigo mais acertar. Pensando um pouco melhor, não sei exatamente porque motivo teria abandonado as fórmulas de matemática. Hoje eu não estaria me atendo com tantos males individuais. Tudo se resumiria a uma equação que, se não solucionada, bastaria me valer das integrais diferenciais com tendência para o infinito.


Seriam elas as responsáveis pela longevidade mental da minha professora de cálculo integral, que a esse despeito dos longos anos exercitando seu cérebro suplanta suas dificuldades físicas de caminhar? E já que exercitando demais o cérebro teria se esquecido do corpo físico, ainda assim, vai ao supermercado, escolhe os legumes, compra-os quase sem aguentar carregá-los, mas efetivamente colocando seu cérebro ávido de cálculos em atividade, satisfazendo um pouquinho da suplica diária que deve suportar destes neurônios.


Então, o que é para mim aceitar as interferências de Alice? Cada qual que se faça apto a reconhecer as cobras às quais temos dado vida, restando ao final, somente a ciência de que somos responsáveis por elas tanto quanto por nós próprios.

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