setembro 20, 2009

O QUE EU TENHO CONTRA MIM? – 11.09.09


Foi anteontem à noite, quando Alice nas suas possibilidades reais de êxito, colocara tudo a perder. Resultado: o maior fracasso que já tivera na vida.
Primeiro, sentiu uma enorme vontade de sumir, de largar tudo e não ser encontrada por ninguém. Depois, tentou aplicar as técnicas de convivência consigo e suas limitações, sem muito progresso.
Mais tarde, obtido algum consolo, desses que vêm depois da localização das falhas que levaram àquele sofrimento, admitindo preguiça e essas coisas que corroboram para que você tenha certeza da sua culpa, máxima culpa.
Como não pretendesse mais a esta altura da vida mudar nenhum sistema, essas coisas cansativas e chatas, resolvera melhor, não ser tão cruel consigo. E começou perguntando-se: O que eu tenho contra mim? Não sou realmente de confiança? Eu posso mudar este quadro?
Tendo encontrado respostas para tudo, resolveu ser mais tolerante com suas falhas, embora muitas sejam básicas, até mesmo expondo por vezes, as regras elementares de sobrevivência, colocando-se em risco de graça só para ver no que vai dar.
Concluiu que a vida é assim. Descobriu que lhe falta aceitação até da ordem mais elementar da natureza e seus ciclos. Ela odeia os ciclos. Odeia repetição. Trouxe vários traumas por consequência desta postura.
Mas, em compensação, ela descobriu que ama muitas coisas na sua personalidade. E nas horas de falhas, que são muitas para o seu gosto, basta mirar-se nas qualidades para que os defeitos sejam minorados. Normalmente são.
Como acreditasse que a prática deve ir além da teoria, começa por agora suas mudanças de tratamento. E o faz pedindo ao cérebro que a perdoe. Por tudo de ruim que tem depositado ali dentro. Ele não é uma gaveta escolhida para ser menos aberta, aquela em que colocamos as roupas fora da estação. Não! Ele merece cuidado.
Alice percebera que vem tratando mal não apenas seu rosto, seu corpo, sua alimentação, mas, seu cérebro. Sabida da realidade que pode criar ou aniquilar busca agora um resumo da matéria que nunca estudou na escola. Sei lá, faça qualquer coisa, decore, degluta, engula, rememore; o importante é fixar, não retornar nem mesmo por comodidade ao estado de então.
Pensa agora onde depositar todo o excesso pesado retirado do cérebro, que ficou ali, como fosse montanha, parada, sem sair do lugar. Mas são removíveis, elimináveis, não faz diferença a sua existência naquela gaveta.
Munida de decisões importantes, pega sua agenda, anota um amontoado de providências, cálculos, e pensa inclusive numa planilha de orçamento doméstico em mãos, já que a do computador tem repelido seus cálculos; “teria ela uma vontade própria secreta de acabar com meu orçamento”?
Pensou muito bem e resolveu, por medida de segurança, revestir a tal agenda não de uma capa, mas, de uma armadura bem reluzente, capaz de frustrar qualquer tentativa que Alice tenha de abandoná-la, justificando que precisa exercitar neurônios.
Tudo bem que os neurônios necessitem passear, sentir novos ares, aumentar sua endorfina, por que não? Mas, Alice precisa também de organização para não se cansar demais.
Assim, logo mais às oito da noite, por certo verá Alice transitando com sua agenda reluzente, eventualmente parando e consultando sobre alguma coisa por fazer, tomando seu rumo em seguida, com a certeza que sempre evitara no seu deslocamento.
E se não pedir muito, pode ser que conste desta agenda, uma lista de supermercado, dessas em que nem precisamos pensar, basta seguir, seguir, seguir... E ao final, veremos se está mais descansada, mais desconsolada por sentir-se inútil cerebralmente falando, ou se irá render-se finalmente ao controle da pessoa sobre as coisas, valendo pensar sobre o inverso. Vamos aguardar para ver quem sairá vencedor, se Alice ou sua agenda.

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setembro 09, 2009

ABRUPTA – 09.09.09


Fosse Alice chinesa e hoje seria um dia de auspícios energéticos de boa qualidade, dado à repetição numérica sincronizada nesta data. Mas ela não é. Em não sendo, luta, pois, por manter seus hábitos como fossem religiosos, já que esses não admitiram uma tendência repetitiva como nada na sua vida.
Tudo lhe parece extemporâneo, em ordem invertida de acontecimentos. E são. Primeiro estuda, depois trabalha; trabalha até encontrar uma aparente acomodação que não vem. Depois estuda de novo, e busca desta feita algo maior, além do aprender, algo por absorver.
Retira da pasta uma considerável tira amarela de papel que somada às anteriores até então, daria bem mais que um pergaminho de devoluções de livros à biblioteca da faculdade. Pensa em guardá-los e associa tal comportamento ao seu pai, que coleciona as passagens de até então. Perfazem sacolas que se somadas, dariam uma distância equivalente a cem voltas ao redor da terra.
Desiste então, por não crer que coleções façam bem, exceto a dos estilistas. Mas, relia ainda a pouco um trecho de Lispector, onde ela descrevia um inseto pousado na cama. Então, lembrou-se do gafanhoto que passou alguns dias em sua cozinha.
Foram sete dias mais ou menos. Aí, Alice recebeu visitas. E o gafanhoto continuava ali, na cozinha, perto do filtro de água. De vez em quando surpreendia Alice mudando de lugar. Mas, era bem estático. Parecido com Alice quando se senta para ler ou escrever ou estudar ou esquecer do mundo ou esquecer dela mesma.
Conviveram assim, ambos esquecidos deles mesmos. Avisara para as visitas sobre a presença do inseto e que ele estava ali já havia algum tempo e que não incomodaria ninguém.
Mas ele se incomodou. Arvorou-se. E Alice foi tentar minorar seu desconforto em meio a tanta gente, numa casa antes só deles dois. Entretanto, Alice esquecera-se da fragilidade insecta e impregnou força desnecessária para espantar o bicho até outro lugar tranqüilo da casa, o gramado do quintal.
E no dia seguinte fora comunicada por um dos hóspedes que o bichinho estava estirado, morto e duro no gramado, dado à força que Alice o espantara. E acabou-se a simbiose entre dois gravetos que pudessem talvez trocar verde, ou inamovibilidade, quem sabe, aderência nas mãos e pés, ou ainda, certo jeito abrupto, que por vezes espanta amigos, familiares, gente boa e gente ruim, mas que indubitavelmente, espanta os outros em geral, podendo até matar, sem querer.
Não culpem Alice. Ninguém ensinou na escola como deveria ser diante dos fracos; não fora advertida sobre os mais fraquinhos e muito menos sobre os fortes, os “fortões” desbravadores de cozinhas.
Pensando melhor, justifica seu jeito abrupto por ser o que conheceu bem cedo, mesmo não aprendendo a conviver, aprendeu, no entanto, a enfrentar. Admitindo desconhecer levezas que não a sua bem camuflada, admitindo sua total ignorância acerca da sutileza que envolve a fragilidade das coisas, dera o primeiro passo para começar a mudar. Vai tentar primeiro com os gafanhotos.
Ao final, sendo dia bom na numerologia, e gafanhotos constituem sabedoria nas artes chinesas, então, tudo compele para o lado do aprendizado sobre a força, optando pela sua não utilização, evitando ao final ser abrupta, ainda que por força da necessidade.

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