fevereiro 21, 2016

ESSA SOU EU - 21.-2.16


            Hoje terminou o horário de verão. Confiro meu relógio acertado com o notebook e o celular, devidamente corrigidos automaticamente. Novamente o tempo batendo em minha porta, como avisasse que estou jogando-o pela janela.
            Por que é domingo, dia único em que não exerço trabalho mental criativo, rememoro agora o que quero realmente para minha vida. Nessa análise entra tudo que cortei para conseguir realizar projetos de pintar, desenhar e escrever.
            Fiz-me só e não consegui ainda o meu espaço de criação. Resolvi nesta última semana que será no quarto. Ganhou tela de nylon na porta para estar aberta até mais tarde e assim, salvar-me do cheiro de tinta.
            Depois de assistir o documentário “Ziraldo profissão cartunista”, vi-me ali espelhada, entendendo somente agora o meu trânsito sempre congestionado entre o trabalho de funcionário público e o de executora de projetos cuja realização não se concretiza.
            Entendi porque pessoas que lidam com a criatividade necessitam da exclusão social, e de cantarolar, e alterar horários porque a criação nalgumas vezes não espera.
            Tento agora, com certeza de caminho certo, executar tarefas múltiplas, uma vez que também necessito atividade física, fazendo meia hora de corrida em frente da televisão, depois, sentar e escrever e mais tarde, quem sabe, desenhar.
            Tem uma história martelando os neurônios, de tal sorte que ainda não vislumbrei a cara das personagens, mas que me atormentam muito mais do que alguém possa entender.
            Chamo a isto de mix, tal qual do Aderbal, que recebe seus entrevistados num estúdio que mistura escritório, banheiro, teatro e sala de estar, tudo ao mesmo tempo.
Entendo agora que estava evitando esta mistura necessária quando se trabalha em casa, sendo organizada ao extremo. Mas, talvez porque ontem percebesse as complicações que permeiam meus relacionamentos, nada apaziguados, sempre impossíveis, acabei aceitando trabalhar aqui no meu quarto sideral, estratosférico, com telinha anti-insetos.
É que descobri os poderes do carmenerè chileno, que poderá, com um pouco de resistência deste frágil fígado, e com doses homeopáticas, aliando os shows musicais que vejo na TV, somando, como nos tempos da matemática, tarefas múltiplas, tudo isto buscando reconhecer-me assim, obcecada por trabalho, competindo com minha própria sombra, buscando em vão driblar o tempo.
Então, ao final, aceitar-me assim, fazendo pazes comigo, neutralizando os indesejáveis sempre presentes comentários de colegas que não entendem necessidades outras além do trabalho, da escola e das futilidades a que se entregam soberanos e sem cobranças, sem diferenças indesejáveis, todos ali, uniformes e competentes nas suas mesas.

E eu aqui, transtornada por mais uma história, um desenho que aquiete a alma, e me traga calma para não transformar-me num ser que amontoa obras e depois não sabe o que fazer com elas. Ai que medo!

fevereiro 19, 2016

CARMENERÈ CHILENO- 19/02/16



         Esta anacademia crescente é uma questão de incongruência com o meio. São reflexos que respingam nalma de tal sorte que levam a um mix entre opostos. É uma vontade contida de separar opostos enquanto neles se transita.
         O carmenerè chileno, de início pareceu sabor impróprio. Mas depois, bem depois, com o coração macio e cheio de vontade de novos sabores, ainda que opostos ao prato de arroz, feijão e salada, sem carne, veio à tona seu gosto apimentado, lembrando menos da uva e mais de condimento, eis descoberto um tesouro na geladeira.
           Não por acaso ali abandonado, mas com o dedo e o crivo da "expert chef" que escolhe com requinte de aroma, cor, sabor, sem incomodar-se com preço, essa preocupação de oposto que não sai de mim, não sai de mim, não sai. Talvez sejam resquícios de um passado em que sabores etílicos se resumissem apenas a efeitos...
              Enfim, fora hoje o dia fazer pazes com o vinho, retornar à literatura, assumir o gosto por opostos, vigiar qualquer intolerância, aceitando pacificamente que o rico é tão cansativo quanto o pobre; o salmão é bom e melhor com queijo de leite de búfala e legumes; mais um mix do rico com o pobre?
               Mas, o melhor, depois de aprender a ingerir doses homeopáticas de vinho, é reconhecer-se nada coitada, tentando com a polida e pobre educação, esmerada não se sabe em qual meio, refinada sem atributo que o valha, porém, com a força que não se reconhece terrena, e agora, descobrindo-se capaz de falar do que não gosta, do que não quer dentro dos seus dias, e de como se livrar de todos aqueles que se lhe apresentam pobres mandantes do que nem sabem o quê!
                   Seria efeito da uva, das notas de pimenta verde e tabaco no vinho? Vai saber!
E com saudade do Suassuna, como diria Chicó: "só sei que foi assim..."; e com ele, tentando saudar dias nefastos de trabalho em grupo (sinônimo de tortura para escritores e pintores), bom rememorar as duas armas que tal como ele, todos deveriam guardar: o riso a cavalo e o galope do sonho para enfim, transpor a tristeza, a solidão e até a morte.