agosto 17, 2009

A AFIRMAÇÃO DE ALICE – 17.08.09


Foi curiosa a forma como Alice passou a exorcizar a sua insegurança. Foi ali, dentro da sala de aula, fazendo perguntas ao professor que se mostrou inseguro, meio assustado, deixando nitidamente estampada a sua incerteza; o pior é que o professor é bom, dedicado, domina o terreno em que pisa, ficando, no entanto, vacilante quando Alice pergunta algo.
Ele nem desconfia sobre sua contribuição para o tratamento em longo prazo ao qual a aluna Alice tem passado em busca da certeza sobre as pessoas e coisas. Tampouco precisa saber. Estas aulas serão para Alice, pequenas doses homeopáticas de segurança sobre todas as situações as quais dominamos de fato.
Um passo maior rumo à cura ela já começou a traçar desde o dia em que recebera um elogio de uma colega de trabalho, tendo imediatamente perguntando se aquilo era mesmo um elogio ou um deboche.
Como a doadora do elogio se sentisse ofendida, Alice consertou a situação explicando a sua tendência por duvidar de tudo quanto se manifesta favorável a ela, assumindo publicamente a sua desvalorização pessoal.
Por perceber semelhança de insegurança entre ela e o professor, passa agora a utilizar-se desta circunstância para restabelecer aquilo que lhe faz mais falta no momento: a sua afirmação sobre as pessoas e coisas.
De forma cristalina ela percebe o quanto padece o professor cada vez que ela abre a boca para perguntar. Não que pretendesse valer-se disto para impingir maior sofrimento ao pobre, embora muitas vezes tivesse ela passado por isto.
Mas, exatamente por conhecer de forma íntima este sofrimento psicológico, ela nutre pelo professor uma estima diferente daquela que não nutre pelos demais, os seguros, os bem-resolvidos, por conseguinte, os que se deliciam pensando-se superiores a todo o resto incapaz de perguntas embaraçosas.
Assim, munida da certeza de que o semestre promete um avanço interior ainda maior do que poderia a língua propiciar, Alice se prepara para exercitar juntamente com o professor, toda aquela situação imperceptível para os demais, ao menos no que diz respeito a reconhecer o sintoma e valer-se dele para a busca da melhora, quem sabe da cura para eles dois.
Pensando melhor, talvez essa cura tenha uma chance maior de ocorrer em favor do professor, dado a sua ausência de percepção e de metas a alcançar, fatores esses que costumam nos levar a um caminho confuso, com buscas além do que podem nossas modestas aspirações efetivar.
De qualquer maneira, ela pretende trocar figurinha, ou mesmo comprar as mais raras, se for este o caminho a trilhar em busca da cura que salvará eles dois do famigerado mundo dos bem-sucedidos e capazes de devorar o fígado de quantos cruzem seus caminhos de sucesso e glória; esses mesmos que nunca sofrerão como nós outros, porque desconhecem a possibilidade de não serem tão bons.

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