maio 30, 2009

O DOM DE ILUDIR – 30.05.09



Foi assim: era mais uma aula de inglês com colegas sempre variando. Ela havia começado há pouco e com o dom de iludir com conversa desinibida, passou de cara a imagem de que já soubera inglês suficiente para estar ali conversando.
Monosilabicamente e com resposta curtas – não, curtíssimas, ficou sem entender até agora porque fora detida como a sabida da turma. Isto não duraria muito, e então, foi pega engasgada sem entender quase nada do texto.
Ela teria revirado da cova o seu velho exemplo escrito por Rubem Braga, utilizando-se da sua psicologia natural para tentar advinhar o que seria o raio de objeto perguntado pela professora na sua “Aula de inglês”.
Com ela não fora intencional, tampouco tentara advinhar a resposta. Também não tinha interesse de impressionar, de passar-se por muito entendida da matéria. Não era assim com ela. Apenas queria e ainda quer aprender a falar inglês. Pensa saber escrever, embora nenhum dos professores pelos quais passou aplicassem nela algum teste de escrita. Por que não?
Para ela tudo é “para maior” se o assunto é inglês. Quer saber ler e escrever corretamente, dentro da melhor gramática que puder ousar. Mas, antes de tudo, antes de todas as outras aprendizagens que tem tentado, falar inglês é para ela uma questão pessoal, intransferível e sumariamente necessária. Nem sabe para que. Foi nisto que deu toda a sua busca por novas línguas, costumes, culturas e uma série de emaranhados se entrelaçando no meio do seu caminho.
Especialmente hoje, depois de mais uma manhã tentando demonstrar sua incompetência até então oculta, conseguira finalmente o êxito que poderá salvá-la de uma falsa aprendizagem. Mostrou-se burra, analfabeta, com dificuldade de articular a mais elementar das frases da língua inglesa.
Como prêmio, uma redução na velocidade em que as conversas fluiam na classe. Decepcionando talvez o professor que jogara muito confete antecipado, ainda assim, ela sentira finalmente estar no seu devido e confortável lugar de aluna que quer aprender inglês.
Então vejamos: uma vez despreparada para longas frases, com um déficit de memória que nem julga ser tão latente, sentiu o sabor de saber pouco, quase nada, em meio àqueles que já decoraram o texto e estão cansados das repetições.
Ao final, ela acusa mais um somatório esquisito entre os muitos que tem abstraído por tempos, como este de estar sempre no meio de pessoas que sabem muito mais do que ela. Pensou como seria bom conversar com alguém que pudesse ensinar um pouco. Ainda saberia? E descobriu que se fez estudante profissional, dessas que até quando joga conversa fora, depois as recolhe todas, levando em um saquinho para casa. Lá chegando, ela as coloca de volta na mesa e faz uma memorável refeição de ideias novas.
Desta vez ela afiança que não irá desistir do incansável professor e sua didática de dar-lhe crédito que não merece, situação que não está absolutamente acostumada a deparar, e que exatamente por isto, haverá de despertar nela uma imensa vontade de familiarizar-se a este novo método de valorização daqueles que estão bravamente engatinhando ao sabor de aprendizagens opcionais.
E depois do final, ela acrescenta mais um feito ao dom de iludir que com grande probabilidade de prejuízo ao gastar dinheiro que não sobrava, obtivera como lucro, a resposta que lhe garante um caminho árduo, porém, com expectativa de um benefício permeado de satisfação nunca antes experimentado.

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