DEU-SE UM LUXO – 07.03.09
Foi ontem pela manhã. Laura reservara para si um mimo, um afago, um luxo que nunca se dera antes, nem mesmo em sonho. Na verdade, ela não fora capaz de dar-se a tão especial presente por decisão própria. Não! Houve eventuais pressões rápidas e indolores, ministradas semanalmente, em doses homeopáticas, indicando-lhe o caminho das Índias.
Laura não é dessas que perde bons conselhos e se nega a aproveitar experiências alheias em sua vida. Graças a isto se mantém intacta, tal qual uma boneca descolorida de gesso.
Hoje estava definido que seria o dia de entender os porquês não respondidos e sempre perguntados. Fez seu orçamento para o mês onde incluiria ali a sua hora de viver. Era como se saísse para passear com ela mesma; perguntou-se onde gostaria de ir, o que gostaria de fazer, enfim, deu-se preferência pela primeira vez na vida.
Inseriu em seu tempo para si como sendo a hora de ser descoberta. E foi uma grata e doída surpresa. Ao final da sua sessão de terapia, Laura descobrira a origem do seu posicionamento sempre à margem da vida, das decisões, das escolhas, e de tudo mais.
Quando saíra de casa era Laura. Ao voltar já era outra. Pensava em todos os seus passos, em acontecimentos e seus porquês e já não evitava mais as respostas. Reconheceu a fragilidade da sua formação, tentou questionar se havia a mesma similaridade na educação dos filhos e imediatamente desassociou tais ideias.
Apenas aprendera a reconhecer-se melhor, sem medo de uma eventual e necessária reconstrução de uma vida diferente, com posicionamentos que lhe permitam mais vontade de viver, maior equilíbrio, encontrando o seu espaço.
Para tanto, reviu seus conceitos acerca do lugar onde nascera e sempre vivera por intermináveis anos, sempre a espera da hora de deixar aquele lugar, um ideal que se cristalizou sereno quando viu suas filhas partirem. Foi como se consolidasse ali a oportunidade que um dia quisera, mas que não era reservada para si.
Também seria assim com a maioria dos bens e dos pertences ao longo da sua vida deixados de lado, não despertando em Laura a menor vontade de reavê-los. Entendeu mais, porque tais comportamentos não são normais nas pessoas e o que eles costumam desencadear uma vez instalados e apoiados.
Assim, depois de um balanço que terminara sem saldo nem crédito, restou para Laura a certeza de que continuar é uma necessidade, talvez incompatível com sua possibilidade, mas que segundo sua tendência em quase nunca poder nada para si, deverá por certo, criar subterfúgios intermináveis para atropelar seu tratamento, ainda que parcialmente se mostrando a caminho.
De resto, ela se presenteou com o alívio por sentir que através da reconstrução dos comportamentos tudo pode ser alterado para o lado que lhe for conveniente, ou verdadeiro, ou quem sabe, para um modo mais real de viver.
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